2.3.05

Mais Belém

Estive com o Marson na exposição do Luiz Braga em cartaz no MAM-SP. Não sou tão entusiasmado como meu amigo, que considera o Braga o melhor fotógrafo brasileiro, mas mesmo assim fiquei impressionado. Desejo frisar aqui alguns aspectos únicos da obra do Braga que me chamaram a atenção (assumo a co-autoria do Marson, pois fomos desenvolvendo as idéias enquanto passeávamos pela exposição).

1- o aspecto mais óbvio: a mistura de luzes desbalanceadas. O Braga fez um uso intenso desse expediente, muitas fotos de lusco-fusco misturam a filtragem ímpar dos céus de Belém com luzes internas às cenas registradas, criando um impacto único que liga um pouco sua obra à de Miguel Rio Branco. As cores saturadas ajudam a complementar essa estética. O uso do cromo entre o fim da tarde e o começo da noite resulta, em alguns casos, em um ligeiro desfoque, talvez causado pela baixa velocidade demandada. Esse é um grande charme, que evoca ligeira ilusão impalpável. Se vc vê de longe, há o foco e a figuração, se vê de perto, grãos que se diluem em efeitos cromáticos sem fronteiras precisas.

2- Os retratos: há algo de muito forte neles, que certamente nasce da interação do fotógrafo com os fotografados. O menino dos amendoins, o garoto e o cão, o estivador cortando uma laranja ao meio, o barqueiro que posa deliberadamente, o moleque com a pipa, os vendedores de açaí, a mãe e sua filha num pequeno boteco, a babá e a criança que observam o rio, a garçonete, pessoas imersas na vida da cidade, que não levam em si a necessidade de aparecer ou posar. A sinceridade reina absoluta sobre a aparência. Marson captou algo de vulnerável nesses personagens do cotidiano da cidade que ganham uma aura de pureza e fragilidade. Não concordo que o garoto com o cão esteja com um quê de homossexualismo. Pelo contrário, há uma virilidade de moleque que se entrevê pelo enquadramento magistral. Mas fecho plenamente com Marson quando este vê nos retratos o ápice da mostra e uma das grandes manifestações do gênio fotográfico de Braga.

3- O apuro formal: nas fotos de Braga, as cores não aparecem de forma gratuita, mas em um todo harmonioso e bem composto. A composição e o corte são elementos indissociáveis da estética fotográfica, que o fotógrafo demonstra dominar completamente. Destaco, nesse sentido, a foto da mesa de sinuca, que dissolve a tridimensionalidade da quina e da bolinha em nome de composição formal bidimensional.

E viva Belém e a fotografia paraense!

Além de Braga, ainda estarão em cartaz simultaneamente em São Paulo Flávio Damm na Pinacoteca, Luiz Trípoli no Masp e Mapplethorpe na Fortes Vilaça... um mês que promete.